quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Multiétnica


- Andem em silêncio pois está rolando a gravação do CD das etnias.

CD das etnias?


Fui chegando na oca central e as vozes femininas misturadas com o som dos pés ritmados no chão ficou enorme.

Caraca, a gente tem mesmo tudo virado para a lua... Os caras estão gravando o CD das tribos bem na hora que a gente chega...

Eu saquei a minha câmera, entrei na oca e aí, me esquece. Pirei mesmo.

Era índio dançando, índio assistindo, índio dormindo, índio ninando índio miniatura, índio posando para foto, índio rindo. Eles e eu, rindo à toa com aquele presente inesperado. A viagem começou definitivamente duca.

Dançaram, cantaram e tocaram. Várias tribos desse Brasil inteiro, pintadas, paramentadas, cada uma com as suas cores, seus símbolos, seus sons. De comum, a cor da pele, os cabelos lisos e negros, os olhos amendoados e as Havaianas. Como índio gosta de Havaiana, gente. Não se vê unzinho sem as suas legítimas que não deformam e não soltam as tiras.

No dia seguinte acordamos e fomos confraternizar. Coisa de louco aqueles índios todos vestidos de gala, colares, cocares, pulseiras, adereços, cabelo raspado, pele pintada, de cócoras... comendo com garfo e faca. No prato, com garfo, com faca e de Havaianas. Sabe aquela sensação de que algo está muito errado, de que alguma coisa não pertence àquele todo? Pois é.

Perto dali, dentro da oca, em uma fila de escrivaninhas com computadores se lia: “Uso exclusivo dos indígenas”. Pai, mãe, criançinhas, todo mundo de olho nas telas e manejando mouses. Caraca. Os caras nem falam português mas usam a internet...

Eu precisava registrar aquilo. Apontei a câmera e:

“Um real, um real.”

Disseram uma menina e um garoto em português quase ininteligível. Tá, não falam a língua mas usam a internet e sabem cobrar por fotos. Aquele pedido de dinheiro me causou um mal estar, por eles e por mim, me senti intrusa e eles, provavelmente usados.

“Eu não tenho um real aqui. Mas as fotos ficaram lindas, vocês querem ver?”

Caras de ãh?.

Mostrei a câmera, cabecinhas balançaram um sim.

Eles viram, riram para a tela, riram para mim. Pediram mais. Sem dinheiro envolvido, as imagens na telinha seriam a minha retribuição. Eles gostaram. Eu me senti menos intrusa, eles, menos usados e a gente até se divertiu. Rindo nas fotos, eram crianças como todas as outras.

No último dia fomos a uma balada local, casa de forró. Quem chega? Os índios. Uma galera toda vestida para festa. Entrou, fez roda e começou a cantar e a girar batendo os pés. Coisa forte essa, o som diferente daquelas vozes, o ritmo marcado no chão, grave, uma corrente, um redemoinho invisível que arrastou a balada para dentro e quando vi, a balada inteira estava a rodar batendo os pés ao som daquele canto.

Uma passagem. Assim como começou, se desfez e sumiu pela porta da frente, um sambinha invadindo a pista e dispersando o redemoinho, a corrente e os sons.

Doida demais essa experiência com os índios. Pessoas tão diferentes de mim quanto se pode ser. Um bololo de fascínio, receio, curiosidade e, por incrível que pareça, identificação. O redemoinho é humano e universal, afinal.

2 comentários:

Helena... disse...

Juju, demais... preciso saber tudo dessa viagem sua.... Menina, o guto teve avô indio e esta louco para ver e ter fotos de indios caracterizados e pintados, pq ele quer fazer uma tatoo desse esquema, manda umas fotinhso para ele ou para mim, por favor!!! seria óootimo.

Meu, queria muito ver e participar de algo desse tipo, quando der me avisa, quem sabe, né?!?!

Bjos!!!!

Maíra Colombrini disse...

É oficial: ESTOU MORRENDO DE INVEJA!
As fotos ficaram lindas.

Bjs!