A Lu é a minha faxineira, uma figura que casou com um amigo da filha 19 anos mais novo e que paga o dízimo na Universal religiosamente apesar das minhas indignadas manifestações. Simples que só ela, fala tudo errado e escreve pior ainda. Vocês precisavam ver os hieróglifos que ela deixa para mim na porta da geladeira.
Toda sexta chega alegrona e já vai direto ferver com o Luke que é louco por ela. Essa parte da ferveção dura lá a sua meia hora enquanto ela me atualiza de uma parte das novidades da semana em Hortolândia. A outra parte ela me conta durante o café que já virou rotina: café de sexta tem que ter histórias da Lu e todas as risadas que as acompanham invariavelmente.
E que histórias. Algumas eu tive a brilhante idéia de anotar. Outras, e isso é uma pena, já eram. Não ficou nem uma vaga lembrança nessa minha memória de tilápia. O que sobrou eu resolvi registrar aqui. Histórias da Lu nas palavras da Lu:
- “Ju, eu tive um patrão que era um pedaço, sabe. Uns pernão que só Deus. Era médico, ainda por cima. A gente se adorava até que ele resolveu arrumá uma muié que é o demônio. Nunca me aturou, a mardita. Me atazanava a vida tanto que eu resorvi caí fora. Num dá, Ju, ela ciúma muito dele até hoje.”
- “Esses dia teve a inauguração de uma obra lá perto de casa e o Serra foi fazê a cerimônia. Precisa vê que bonito que foi. Meu marido pagô manicure, pedicure e cabelo pra mim e ainda me deu uma calça de setenta real. Nunca tinha vestido uma calça nova de setenta real, Ju. Me arrumei toda e fiquei linda. Cê sabe que eu gosto de fica toda perua, né? Fiquei tão emocionada que até chorei quando o Serra chegô. Eu amo o Serra, Ju.
- Jura Lu? Por que?
- Sei não. Acho que é porque ele parece com o meu avô...”
- “Eu acabei com tudo as minhas coisas de banco. As loja rouba a gente. A C&A? Nóis compra uma calça de cinqüenta real e ela custa duzentos se juntá tudo as prestação do cartão. Fiquei tão braba que cheguei pro moço e disse prá picá o cartão em um monte de pedacinho. Ele assustô e disse que não podia. Falei: pode picá. Ah não, Ju, eu tenho ciúme do dinheiro que eu ganho.”
- “Ju, o maridão colocô prá trabalhá uma camiseta com uns escrito em inglês que nóis compramo na igreja e um cara que disse entendê das coisa falô que o que tá escrito lá é coisa do demo. Eu disse pra ele que não pode sê, já que foi o pastor que vendeu pra nóis mas ele teimô que teimô e o povo tá tudo cabrero. Eu trouxe aqui copiado as palavra pra ocê me dizê se é mesmo.
[No Sacrifice, No Success]
- Hahaha. Pode ficar tranquila que não tem nada de demo aí, Lu. Só diz que sem sacrifício não se tem sucesso. Pode falar para o pessoal.
- Mesmo Ju? Tem certeza?
- Mesmo. Nada a ver. Pode ficar sussa.
- Ai meu Jesuis, graças a Deus. Eu falei prá ele que essa coisa de Sacrifice não era o que eles tavam pensano... Eu gosto tanto de conversá coceis que têm estudo que oceis esclarece a gente.”
Há umas três semanas ela veio me dizer que estava com umas coisas estranhas no útero e que iria fazer uns exames. Fez. Ecografia atrás de ecografia, teste disso, do outro e o resultado foi que os médicos ficaram preocupados e resolveram marcar uma cirurgia para tirarem os cistos. A psicóloga foi dar a notícia para ela com todo o cuidado e sabem qual foi a resposta? “Ih minha filha, pode tirá tudo, deixa só as tripa, o cérebro e o coração que do resto eu num preciso mais.” Em vinte e tantos anos de profissão a mulher nunca tinha recebido uma resposta dessas. Coisas da Lu.
O tempo passou e a cirurgia vai acontecer. Hoje. A Lu vai ficar um tempão sem aparecer por aqui e as minhas sextas vão ser bem menos divertidas até a sua volta. Sem problemas, eu espero. Boa sorte, Lu. Que saia tudo bem e que você volte inteirona, mesmo que só tripas, cérebro e coração. Com um coração desse tamanho o resto não vai fazer mesmo muita falta.
3 comentários:
hahahahahah, muito bom!
O que mais surpreende é a simplicidade destas pessoas, verdadeiras lições de vida.
Mas cá pra nós a história do sacrifice foi demais! Como vc diz: Coisas da Lu!
bjs
Hehehe...Ju e a gente conta essas coisas e ninguém acredita que acontecem mesmo...hehehe
Bjus
Pois é, anônimo (?), ela falava cada coisa. Sexta ela já não veio e fez falta....
Me acostumei com o bom humor dela de manhã (manhã mais ou menos pq ela sempre chegava lá pelas 11h...rs).
Kika (pq a mudança de apelido??? Ein?), vc chegou a conhecer a Lu? Quem conhece sabe que essas histórias aí são só uma amostra da figura.
Beijão
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